GEF/UEM – Grupo de Estudos Foucaultianos da UEM
Orientação: Prof. Dr. Pedro Navarro
Organização: Adriana Beloti
Discussões realizadas em: 07/04/2010.
Cap. XVII: A GOVERNAMENTALIDADE[1]
A partir de uma análise histórica de alguns dispositivos de segurança, Foucault procedeu a uma análise da população, o que o levou à questão do governo, tema discutido no capítulo XVII da obra Microfísica do Poder. Por suas reflexões é possível percebermos que o poder esteve, a todo o momento, permeando suas observações e, neste texto, desde a teoria de Maquiavel, que tem como norte O Príncipe, até às propostas anti-Maquiavel, ou seja, a arte de governar.
Dos tratados de conselhos aos príncipes da Idade Média e da Antiguidade greco-romana aos tratados da arte de governar, do século XVI ao XVIII, surgem os problemas do governo: “problema do governo de si mesmo”, “problema do governo das almas e das condutas”, “problema do governo das crianças”, “problema do governo dos Estados pelos príncipes”. De acordo com Foucault (2007, p. 278), trata-se da “problemática geral do governo em geral”. Desses problemas de governo têm-se os três tipos de governo: “cada um se referindo a uma forma específica de ciência ou de reflexão. O governo de si mesmo, que diz respeito à moral; a arte de governar adequadamente uma família, que diz respeito à economia; a ciência de bem governar o Estado, que diz respeito à política” (2007, p. 280).
Até o início do século XVIII, a arte de governar foi, de certa forma, travada por algumas situações. Passada essa fase de entraves e bloqueios, conseguiu, enfim, um processo de desbloqueio e de avanços, dados alguns fatores sociais e históricos, em específico, por sua relação com a emergência do problema da população. Num primeiro momento, a população “permitirá eliminar definitivamente o modelo da família e centralizar a noção de economia em outra coisa”. A família deixa de ser modelo de governo e passa a ser instrumento fundamental para o governo da população. “Portanto, aquilo que permite à população desbloquear a arte de governar é o fato dela eliminar o modelo da família” (FOUCAULT, 2007, p. 289).
A população aparece como objetivo e instrumento do governo não sendo mais vista como força do soberano. São os interesses individuais e coletivos que se tornam, nessa perspectiva, o alvo e o instrumento fundamental do governo. A população se torna objeto do governo em relação a suas observações, seu saber, sendo considerada por este para que consiga “governar efetivamente de modo racional e planejado”. Nas palavras de Foucault (2007, p. 290), “em suma, a passagem de uma arte de governo para uma ciência política, de um regime dominado pela estrutura da soberania para um regime dominado pelas técnicas de governo, ocorre no século XVIII em torno da população e, por conseguinte, em torno do nascimento da economia política”.
Questões relacionadas à soberania e à disciplina não foram extintas. Ao contrário. Conforme pondera Foucault (2007, p. 291), “a idéia de um novo governo da população torna ainda mais agudo o problema do fundamento da soberania e ainda mais aguda a necessidade de desenvolver a disciplina. Devemos compreender as coisas não em termos de substituição de uma sociedade de soberania por uma sociedade disciplinar e desta por uma sociedade de governo. Trata-se de um triângulo: soberania-disciplina-gestão governamental, que tem na população seu alvo principal e nos dispositivos de segurança seus mecanismos essenciais”. Em síntese, o filósofo afirma que procurou mostrar a profunda relação histórica entre os movimentos de governo, população e economia política, movimentos que passaram da soberania, como força única e exclusiva do soberano, ao aparecimento da população, como objetivo e instrumento do governo e, por fim, à economia política como ciência e técnica de intervenção.
Vale ressaltar aqui o que Foucault, ao final de todas essas discussões, afirma entender por governamentalidade (2007, p. 291-292):
1 – o conjunto constituído pelas instituições, procedimentos, análises e reflexões, cálculos e táticas que permitem exercer esta forma bastante específica e complexa de poder, que tem por alvo a população, por forma principal de saber a economia política e por instrumentos técnicos essenciais os dispositivos de segurança.
2 – a tendência que em todo o Ocidente conduziu incessantemente, durante muito tempo, à preeminência deste tipo de poder, que se pode chamar de governo, sobre todos os outros – soberania, disciplina, etc. – e levou ao desenvolvimento de uma série de aparelhos específicos de governo e de um conjunto de saberes.
3 – o resultado do processo através do qual o Estado de justiça da Idade Média, que se tornou nos séculos XV e XVI Estado administrativo, foi pouco a pouco governamentalizado.
Por fim, esse filósofo (2007) destaca que “o importante para nossa modernidade, para nossa atualidade, não é tanto a estatização da sociedade mas o que chamaria de governamentalização do Estado” (p. 292). Para ele, o Estado, da forma que existe hoje, deve-se à sua governamentalidade, tanto interior quanto exterior, às suas táticas gerais de governamentalidade. “Este Estado de governo que tem como alvo a população e utiliza a instrumentalização do saber econômico, corresponderia a uma sociedade controlada pelos dispositivos de segurança” (p. 293).
[1] FOUCAUTL, M. Microfísica do poder. Tradução Roberto Machado. 24. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 2007. p. 277 – 293.
Orientação: Prof. Dr. Pedro Navarro
Organização: Adriana Beloti
Discussões realizadas em: 07/04/2010.
Cap. XVII: A GOVERNAMENTALIDADE[1]
A partir de uma análise histórica de alguns dispositivos de segurança, Foucault procedeu a uma análise da população, o que o levou à questão do governo, tema discutido no capítulo XVII da obra Microfísica do Poder. Por suas reflexões é possível percebermos que o poder esteve, a todo o momento, permeando suas observações e, neste texto, desde a teoria de Maquiavel, que tem como norte O Príncipe, até às propostas anti-Maquiavel, ou seja, a arte de governar.
Dos tratados de conselhos aos príncipes da Idade Média e da Antiguidade greco-romana aos tratados da arte de governar, do século XVI ao XVIII, surgem os problemas do governo: “problema do governo de si mesmo”, “problema do governo das almas e das condutas”, “problema do governo das crianças”, “problema do governo dos Estados pelos príncipes”. De acordo com Foucault (2007, p. 278), trata-se da “problemática geral do governo em geral”. Desses problemas de governo têm-se os três tipos de governo: “cada um se referindo a uma forma específica de ciência ou de reflexão. O governo de si mesmo, que diz respeito à moral; a arte de governar adequadamente uma família, que diz respeito à economia; a ciência de bem governar o Estado, que diz respeito à política” (2007, p. 280).
Até o início do século XVIII, a arte de governar foi, de certa forma, travada por algumas situações. Passada essa fase de entraves e bloqueios, conseguiu, enfim, um processo de desbloqueio e de avanços, dados alguns fatores sociais e históricos, em específico, por sua relação com a emergência do problema da população. Num primeiro momento, a população “permitirá eliminar definitivamente o modelo da família e centralizar a noção de economia em outra coisa”. A família deixa de ser modelo de governo e passa a ser instrumento fundamental para o governo da população. “Portanto, aquilo que permite à população desbloquear a arte de governar é o fato dela eliminar o modelo da família” (FOUCAULT, 2007, p. 289).
A população aparece como objetivo e instrumento do governo não sendo mais vista como força do soberano. São os interesses individuais e coletivos que se tornam, nessa perspectiva, o alvo e o instrumento fundamental do governo. A população se torna objeto do governo em relação a suas observações, seu saber, sendo considerada por este para que consiga “governar efetivamente de modo racional e planejado”. Nas palavras de Foucault (2007, p. 290), “em suma, a passagem de uma arte de governo para uma ciência política, de um regime dominado pela estrutura da soberania para um regime dominado pelas técnicas de governo, ocorre no século XVIII em torno da população e, por conseguinte, em torno do nascimento da economia política”.
Questões relacionadas à soberania e à disciplina não foram extintas. Ao contrário. Conforme pondera Foucault (2007, p. 291), “a idéia de um novo governo da população torna ainda mais agudo o problema do fundamento da soberania e ainda mais aguda a necessidade de desenvolver a disciplina. Devemos compreender as coisas não em termos de substituição de uma sociedade de soberania por uma sociedade disciplinar e desta por uma sociedade de governo. Trata-se de um triângulo: soberania-disciplina-gestão governamental, que tem na população seu alvo principal e nos dispositivos de segurança seus mecanismos essenciais”. Em síntese, o filósofo afirma que procurou mostrar a profunda relação histórica entre os movimentos de governo, população e economia política, movimentos que passaram da soberania, como força única e exclusiva do soberano, ao aparecimento da população, como objetivo e instrumento do governo e, por fim, à economia política como ciência e técnica de intervenção.
Vale ressaltar aqui o que Foucault, ao final de todas essas discussões, afirma entender por governamentalidade (2007, p. 291-292):
1 – o conjunto constituído pelas instituições, procedimentos, análises e reflexões, cálculos e táticas que permitem exercer esta forma bastante específica e complexa de poder, que tem por alvo a população, por forma principal de saber a economia política e por instrumentos técnicos essenciais os dispositivos de segurança.
2 – a tendência que em todo o Ocidente conduziu incessantemente, durante muito tempo, à preeminência deste tipo de poder, que se pode chamar de governo, sobre todos os outros – soberania, disciplina, etc. – e levou ao desenvolvimento de uma série de aparelhos específicos de governo e de um conjunto de saberes.
3 – o resultado do processo através do qual o Estado de justiça da Idade Média, que se tornou nos séculos XV e XVI Estado administrativo, foi pouco a pouco governamentalizado.
Por fim, esse filósofo (2007) destaca que “o importante para nossa modernidade, para nossa atualidade, não é tanto a estatização da sociedade mas o que chamaria de governamentalização do Estado” (p. 292). Para ele, o Estado, da forma que existe hoje, deve-se à sua governamentalidade, tanto interior quanto exterior, às suas táticas gerais de governamentalidade. “Este Estado de governo que tem como alvo a população e utiliza a instrumentalização do saber econômico, corresponderia a uma sociedade controlada pelos dispositivos de segurança” (p. 293).
[1] FOUCAUTL, M. Microfísica do poder. Tradução Roberto Machado. 24. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 2007. p. 277 – 293.
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ResponderExcluirPessoal, por que vocês não liberam a cópia dos resumos. Conhecimento encastelado, não é conhecimento; não cumpre a sua função social...
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